Topo

Histórico

Categorias

"Tenho mais técnica do que Chet Baker", diz trumpetista Chris Botti

UOL Música

30/05/2014 12h08

Um dos principais nomes do trumpete em sua geração, treinado na melhor tradição do jazz,  o americano Chris Botti conquistou um raro destaque no mercado pop tocando com artistas de todos os tipos, desde os anos 80, quando chegou a acompanhar Frank Sinatra.

No decorrer da carreira, se destacou por seus duetos com  grandes nomes do rock, como o vocalista do Aerosmith, Steven Tyler, o ex-Dire Straits Mark Knopfler e, principalmente, tocando na banda de Sting. Isso ajudou Botti a promover sua própria banda, que mistura elementos de pop e música clássica à base fincada nos grandes jazzistas dos velhos tempos.

Em entrevista exclusiva, o trumpetista falou sobre suas roubadas no início da carreira tocando com o lendário baterista Buddy Rich, sua relação com o jazz e suas reverência pelos ícones do instrumento. Chris Botti se apresenta em São Paulo nesta sexta-feira (30) no BMW Jazz Festival, que também passa pelo Rio de Janeiro (dia 30 ao dia 1 de junho) e Belo Horizonte (dia 3 de junho),

Rádio UOL – É sua primeira vez no Brasil?
Chris Botti – É a primeira vez com a minha própria banda, mas eu já estive aqui há 10 anos como integrante da banda do Sting e há 20 anos junto com a banda do Paul Simon.chris-botti-1

Rádio UOL – Você gosta da música daqui?
Botti – Sim, amo! Todo músico de jazz tem uma conexão forte com a música brasileira e sabe tudo sobre ela. Uma das minhas primeiras turnês foi essa com o Paul Simon, de um disco muito brasileiro dele, "The Rhythm Of The Saints" e vir tocar aqui com ele foi demais.

Rádio UOL – Voltando ao princípio de sua carreira, você ainda muito jovem tocou com lendas como Frank Sinatra e Buddy Rich. O que você aprendeu com eles?
Botti – Mais do que qualquer coisa eu acho que aprendi o que não fazer. O Sinatra era uma presença gigante no palco e poder observar sua voz era incrível, obviamente.

E tocando na banda do (baterista) Buddy Rich, percebi que não queria tocar numa big band. Não foi uma experiência agradável. Ele é notório por ser, digamos assim, não muito legal como pessoa… Há uma palavra melhor para isso mas eu prefiro não botar na entrevista (risos).

Depois de dois meses tocando com o Buddy Rich eu estava me sentindo miserável eu percebi que queria ser solista, ser um "band leader" e estar à frente sem precisar ser agressivo como ele era com os integrantes da banda.

OUÇA CHRIS BOTTI NA RÁDIO UOL

Rádio UOL – Existem gravações lendárias muito engraçadas, dele dando esporro nos músicos…
Botti – Eu estava lá! Estava sentado bem na frente dele enquanto ele gritava aquele monte de barbaridades.
Todo mundo sabia quando ele ia estourar. E era época do (toca-fitas portáteis) walkman, então quando ele entrava no ônibus nós começávamos a gravar. É daí que vieram essas gravações.

Rádio UOL – Com esta experiência você percebeu que não gostava do formato das big bands em si?
Botti – O formato nunca me atraiu. É muito "militar". Uma big band é exatamente isso, uma banda grande.  Você tem cinco trumpetistas enfileirados, usando a mesma roupa e seguindo uma partitura. É chato. Eu gosto quando os músicos são indivíduos. Eles podem fazer parte de um grupo, mas suas personalidades têm que transparecer.

Rádio UOL – Na sua banda então você procurou fazer algo mais livre.
Botti – Sim, nós não temos cinco trumpetistas, e isso já é uma vantagem. Mesmo com músicos de rock. Quando toquei na banda do Sting, havia músicos muito conhecidos e todos tinham sua própria personalidade. Naquele contexto todo mundo era uma estrela.

Rádio UOL – Falando no Sting, você já tocou com muitos artistas de música  pop. Você se considera um músico de jazz?
Botti – Bem, eu sou um músico de jazz extremamente treinado nessa área. Cresci tocando jazz. Mas no meu trabalho existem elementos de música clássica, de pop obviamente. Na essência eu me considero um trumpetista. Um trumpetista com fãs em quantidade suficiente que me permitem excursionar pelo mundo. Não gostamos de dizer "somos um grupo de jazz", porque isso limita. Mas no âmago, acho que sou um jazzista sim.

Rádio UOL – Como você aplica suas habilidades no jazz quando você está tocando num disco pop?
Botti – Se você está improvisando, não importa se você está tocando com o (guitarrista do Dire Straits) Mark Knopfler ou com o (vocalista do Aerosmith) Steven Tyler, com Yo-Yo Ma ou com o Herbie Hancock. É tudo improvisação, mesmo sendo formas de expressão diferentes. Os acordes podem ser outros, mas basicamente você toca jazz.

Rádio UOL – Então eles te chamam porque querem soar um pouco mais jazz do que o normal?
Botti – Talvez. Acho que no caso dos cantores, é divertido para eles fazer duetos, mas às vezes quando você tem duas vozes cantando juntas, elas entram em conflito e as palavras se embaralham. Mas o trumpete se encaixa perfeitamente a todos os tipos de voz, do Sting ao Steven Tyler.
Então, esses duetos foram para mim uma maneira de atingir outros públicos.

Rádio UOL – Quais destes duetos e participações você considera os mais importantes na sua carreira?
Botti – Minha colaboração favorita é, com certeza, minha amizade com o Sting. Somos mais do que colaboradores, ele é um amigo querido e foi meu mentor, eu valorizo muito a amizade dele. Ele abriu muitas portas e participou dos meus álbuns "When I Fall in Love" e "To Love Again", então, de longe, é disso que eu mais me orgulho.

OUÇA O MELHOR DO JAZZ NA RÁDIO UOL

Rádio UOL – Então você pretende continuar com as colaborações no futuro?
Botti – Claro, com certeza, enquanto houver artistas divertidos de tocar junto eu estarei lá… Se você pega por exemplo toda a música do álbum "Kind Of Blue" do Miles Davis por exemplo, você percebe que ele toca trumpete uns 20% do tempo. Porque neste disco você também tem o John Coltrane, Bill Evans, Paul Chambers e um monte de outras coisas acontecendo.

Então, quando faço minha própria música, não quero me ouvir o tempo todo e fazer duetos com cantores me ajuda nesse sentido. É diferente de tocar um standard e depois entrar um solo de saxofone, para então voltar um trumpete… Você precisa de algo para interromper, dar um descanso. O que é bem diferente de um cantor pop. Num disco do Sting ele provavelmente está cantando 90% do tempo.

Para que um disco de um instrumentista tenha apelo para bastante gente é importante que ele não toque o tempo inteiro, porque senão não vai rolar. Ninguém faz isso. Então os duetos foram uma maneira para mim de tocar liricamente. Me divirto fazendo isso e alcanço um público enorme.

Rádio UOL – Você exerce muito controle sobre o que os outros músicos da sua banda tocam?
Botti – Eu contrato os melhores músicos do mundo e dou a eles bastante liberdade. Curiosamente, quando você toca com um músico brilhante como o (guitarrista uruguaio) Leonardo Amuedo, o talento deles transparece quando eles tocam algo simples e fazem isso de maneira brilhante. Eles conseguem expor o toque pessoal e o timbre que realmente mostram sua arte.

Você pode ter uma banda de faculdade que toca uma porção de coisas complicadas. Mas eles não vão saber tocar de uma maneira bonita, simples e lírica. Quando você tem músicos tocando coisas assim porque você mandou, o resultado não é tão maduro como quando eles podem tocar o que quiserem dentro dos limites do bom gosto.

Rádio UOL – Quem foram os band leaders e trumpetistas que mais influenciaram seu trabalho?
Botti – Como band leader, o Sting. Aprendi com ele a ter apetite para pegar a estrada e viajei o mundo com ele duas vezes, então ele está no topo.

Gosto de todos os pesos-pesados do trumpete, como Miles Davis, Clifford Brown, Wynton Marsalis, Woody Shaw, Freddie Hubbard, Chet Baker, Lee Morgan… Tenho muito respeito por quem deu à vida à corneta e atingiu este nível.

Em particular, tento roubar do Miles o quanto posso e amo a maneira como o Wynton toca também, ele é brilhante. Nossa música é bem diferente, mas eu amo a arquitetura da música dele, é tão graciosa. Mas com certeza, mais do que qualquer um, eu tento emular o Miles Davis de várias maneiras.

Rádio UOL – Você é comparado com o Chet Baker. Você vê esta similaridade ou é apenas por serem trumpetistas brancos no jazz?
Botti – Bem, eu sou branco e consigo fazer o trumpete soar belo, lírico ou triste, todos os adjetivos que você pode dar ao instrumento. Sem querer soar egoista, eu tenho muito mais técnica do que ele tinha.

Mas ele lutava contra um monte de outras complicações na vida, abusos que faziam com que fosse difícil para ele segurar o instrumento durante muito tempo, ele penhorava o trumpete para comprar drogas, era uma bagunça…

Mas acho que associam ele a mim por causa desta habilidade de tocar liricamente por sermos brancos sim.

Rádio UOL – Muitos jazzistas dos velhos tempos tinham essa mística. Eram envolvidos com drogas, com o submundo, tinham um estilo de vida selvagem, como se fossem os roqueiros da época. Você acha que hoje isso faz falta de alguma maneira? Há quem diga que o jazz se tornou muito acadêmico.
Botti – Eu reluto em comentar sobre o jazz, para ser sincero, porque faço música moderna. Da mesma maneira, eu não acho que seja o papel do John Mayer comentar sobre o rock and roll e como ele se relaciona com o Bob Dylan. O trabalho dele é achar um público e entretê-lo.

Da mesma maneira, eu só me importo com a minha banda, meu público e a minha música. Eu na verdade não estou interessado em pegar a estrada e pregar um formato de música tradicional.

O Wynton Marsalis faz isso bastante. Ele tem discípulos que o admiram e tudo mais. Mas eu fico longe disso, acho que te limita e te prende a um gênero. Metade do que fazemos é jazz e metade não é. Mas tocamos num nível super alto.  E isso é o que me importa. Por isso eu fico longe dos rótulos e evito falar em nome do jazz.

Rádio UOL – Como vão ser os shows no Brasil?
Botti – Vão ser uma versão menor do show que está no meu CD/DVD ao vivo em Boston. Temos três convidados especiais: dois cantores e um violinista clássico incrível, além de uma sessão rítmica de primeira linha, com Geoffrey Keezer, Billy Kilson, Leonardo Amuedo na guitarra, então estamos ansiosos para chegar aí.
________________________________________
Chris Botti em São Paulo
Quando: 30 de maio (sexta), a partir das 21h
Onde: HSBC Brasil – a Rua Bragança Paulista, 1281 – Chácara Santo Antônio
Quanto: R$ 70 a R$ 180, pelo Ingresso Rápido

Sobre o Blog

Este é o blog oficial do UOL Música Deezer. Com ele, nós da equipe e nossos colaboradores podemos nos comunicar com os ouvintes, sugerindo, informando, divulgando e discutindo tudo que diz respeito ao universo musical. E é claro, ouvindo o que vocês têm a dizer. Ouça, leia e comente!

2 Comentários

Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.

Wellington Mendes

Definitivamente, ele não ouviu o bastante. Deveria ir fazer a lição de casa.

Wellington Mendes

Se tudo fosse técnica rss. Que sujeitinho engraçado esse daí.

Blog UOL Música